Covão da Ametade, Serra da Estrela. Abril de 2022.
Primeiro é o deslumbramento: com a imponência dos gigantes de granito, imperturbáveis ao fustigar do nevão vespertino, contrastando com as gráceis bétulas bailando ao vento; ou, na serena manhã seguinte, com a delicadeza da neve suspensa nas copas, delineando a branco o caos dos ramos entrelaçados; ou com a beleza etérea do sol nascente, refletido a ouro no cântaro magro e no Zêzere juvenil.
E, logo, a hesitação entre fruir esses momentos memoráveis, ficando nesse encantamento em que se tropeçou, ou registá-los sofregamente, para memória e usufruto futuro… e a ansiedade de não conseguir captar a sua essência fugaz no sensor da câmara, de ficar naquela sensação de inutilidade, de nada ter a acrescentar ao que já foi feito…
Mas o tempo, que aqui rola sem urgência, permitirá, enfim, dirigir o olhar para a paisagem mais íntima, sentir a fragilidade e a solidão de um raminho preso no gelo, reparar no contraste da neve clara com o escuro da rocha dura, texturada, sulcada pelos matizes verdes dos musgos e líquenes, ou com o dourado madrugador que se espraia numa pedra ou numa poça de água, ou ainda ver o beijo que une os ramos de duas árvores vizinhas.
E, pouco a pouco, libertar-se das amarras do figurativo e encontrar emoção e sentido na luz, nas cores, nas sombras e nas formas refletidas na água corrente ou numa fina camada de gelo fraturante – maravilhando-se com o belo que, na verdade, se descobre no interior de si – acabando a criar imagens pessoais com os elementos naturais, que, afinal, se encontram aqui e em qualquer outro lugar.